Incorporadoras buscam melhorar bairros da capital

Entrega de gentilezas urbanas valoriza empreendimentos, mas ações conjuntas entre empresas ainda são raras, e alcance é limitado

Quem circula a pé por determinados bairros das zonas Sul e Oeste de São Paulo tem percebido transformações sutis: calçadas mais largas, paisagismo aprimorado, bancos para descanso, lojas no térreo e ausência de muros. O pacote de “gentilezas urbanas” tem sido uma iniciativa cada vez mais frequente das incorporadoras para melhorar a relação de seus empreendimentos com a cidade. E o que é bom poderia ficar ainda melhor se o diálogo entre as empresas do setor fosse mais intenso e produtivo.

Otavio Zarvos, CEO e fundador da Idea!Zarvos, é pioneiro nesse tipo de projeto. Nos anos 2000, ele entregou dois prédios — um comercial e outro residencial — que marcaram a paisagem da Vila Madalena exatamente por oferecer conforto aos pedestres, eliminar a barreira entre o público e o privado e propor um uso que ativasse a vida diurna de um bairro reconhecidamente boêmio.

“Foi um primeiro ensaio de uso do urbanismo na atividade imobiliária para deixar o lugar mais eficiente, diverso, seguro e saudável”, lembra Zarvos.

O executivo conta que seus empreendimentos respeitam três pilares fundamentais: estética, relação com o entorno e avaliação de oferta que contribua para o bairro. Ele acredita que o mercado está em processo de educação para tornar essa discussão mais madura.

“Aos poucos, as empresas vão tomando consciência de que estão construindo uma cidade, não apenas um prédio, e que devem fazer de tudo para torná-los mais amigáveis”, diz.

Na Zona Sul, duas incorporadoras têm tido atuação consistente nesse sentido. No Brooklin, a Yuny Incorporadora acaba de entregar o Grand Habitarte, uma quadra de 20 mil metros quadrados com passeio arborizado que circunda o condomínio e se tornou um circuito de caminhada utilizado por todos os vizinhos.

“Cidades interessantes são feitas por bairros requalificados, e isso demanda um esforço do mercado imobiliário”, afirma Guilherme Sawaya, diretor de Incorporação e Inovação da Yuny. “Nosso ‘stakeholders’ não é apenas quem mora no prédio, mas todos os que conviverão com o empreendimento.”

Já a Benx Incorporadora teve papel determinante na década passada para o aterramento dos fios em 4,2 quilômetros de vias da Vila Olímpia, bairro onde tem 27 empreendimentos. Agora, com o Parque Global, na região do Panamby, assumiu a gestão do Parque Bruno Covas, que se estende às margens do Rio Pinheiros.

Para Renato Bottoni, diretor de Novos Negócios, Marketing e Comercial, além da preocupação com a melhoria do entorno, esse tipo de ação gera uma inequívoca valorização imobiliária.

“É difícil mensurar se 10% ou 15%, mas os empreendimentos sem postes com fios ou com uma ciclovia na porta, sem dúvida, provocam um impacto financeiro positivo”, analisa.

FALTA DIÁLOGO

Uma questão que tem limitado o alcance dessas ações é a ausência de diálogos produtivos entre as próprias incorporadoras, que reconhecem essa carência. “Faltam maturidade e visão do ponto de vista urbanístico na discussão”, pondera Otavio Zarvos, que admite ter pouco contato com outros players para compartilhar soluções.

Sawaya, da Yuny, entende que há excesso de competitividade entre as empresas. “Poderíamos exercitar mais o conceito de competição com cooperação. É preciso quebrar esses feudos para construir bairros mais interessantes”, pondera.

Um exemplo bem-sucedido de cooperação entre competidores foi dado pelas incorporadoras Helbor e Tegra, na Zona Oeste. “Tínhamos um terreno em frente ao deles com projetos semelhantes”, lembra Henry Borenstein, CEO da Helbor, que chamou o vizinho para conversar e criar um empreendimento único.

O Caminhos da Lapa nasceu desse entendimento ao redor de uma rua-jardim, com via alargada, muito verde, ciclovia e lazer público. “Com certeza, as incorporadoras podem atuar de forma conjunta. Pensando de maneira mais ampla, podem contribuir de forma significativa para a transformação dos bairros”, resume.

Propostas de arquitetos para embelezar a cidade

Nos últimos três anos, ao menos duas propostas de ação conjunta para transformação urbana foram apresentadas às incorporadoras que atuam na Zona Oeste de São Paulo, mas nenhuma avançou.

O escritório FGMF Arquitetura desenvolveu um projeto de ressignificação da Rua Auriflama, em Pinheiros. O projeto incluía calçadas com cinco metros de largura, bancos de descanso e playground. “A cidade pertence ao pedestre, e é preciso dar o peso certo a isso”, avalia Lourenço Gimenes, sócio-fundador da FGMF.

Para ele, o adensamento em curso na região é uma oportunidade de se repensar o espaço público, e ele mostra disposição para contribuir nesse sentido.

“O intuito do projeto foi mostrar a possibilidade de transformação, que pode ser replicada em outros bairros da cidade”, ratifica.

Também em Pinheiros, a Rua Henrique Monteiro virou alvo de grandes incorporadoras de alto padrão, cujo desejo é explorar a proximidade do endereço com o centro financeiro da Avenida Faria Lima.

O arquiteto Arthur Casas, que assina um dos projetos na rua, reuniu por videoconferência todos os empresários responsáveis pelos demais edifícios em construção na rua e apresentou proposta de uniformizar as gentilezas urbanas que seriam feitas por cada um deles. Mas não houve acordo.

“Não havia razão nenhuma para não chegarmos a um consenso. Mas os incorporadores não conseguiram se cotizar para realizar o projeto, orçado em menos de R$ 6 milhões”, recorda Casas.

Segundo ele, prevaleceu a vaidade para liderar o projeto. “Uma ação conjunta traria vantagens para todos, inclusive financeira.”

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